UMA PALAVRA VALE MAIS QUE MIL IMAGENS: AS REPRESENTAÇÕES DOS JUDAIZANTES NOS SERMÕES DE AUTO-DE-FÉ DA INQUISIÇÃO PORTUGUESA (1612-1620)
Aluno de Iniciação Científica: Luís Fernando Costa Cavalheiro (PET)
Curso: História
Orientador: Andréa Carla Doré
Departamento: História
Setor: Ciências Humanas, Letras e Artes
Palavras-chave: Inquisição Portuguesa , Sermões de auto-de-fé , Literatura anti-judaica
Área de Conhecimento: 70503001 - HISTÓRIA MODERNA E CONTEMPORÂNEA
Cegos, surdos, mancos: quando não indicam uma deficiência, não costumam ser elogios. Pelo contrário, demonstram um erro voluntário. Assim era no século XVII, momento que nos interessa. Aquelas palavras faziam parte da linguagem da Inquisição Portuguesa para delimitar a identidade dos inimigos da cristandade. Eram utilizadas em pregações nas cerimônias de autos-de-fé. O que propomos é a análise dessas pregações nos Sermões de autos-de-fé. Ao todo são oito Sermões analisados, pregados entre 1612 e 1620, contidos na coleção compilada por Diogo Barbosa Machado, disponíveis no CEDOPE. A primeira fase da investigação constituiu na revisão historiográfica sobre a Inquisição, no intuito de dar um direcionamento à pesquisa. Embora seja um tema controverso e polêmico, a historiografia inquisitorial ainda não teve um estudo relevante acerca dos Sermões de autos-de-fé. A historiografia do século XIX deu a imagem da intolerância como definição da Inquisição. Essa concepção foi se transformando com a disponibilidade de novas fontes e novas ferramentas metodológicas. Sobretudo a partir da década de 1970, passou a se questionar se a Inquisição correspondia a uma necessidade do momento e como ela se manteve. Daí em diante, um novo método passou a se fortalecer, conhecido como método compreensivo, o qual aplicamos na pesquisa. Outra característica dessa nova historiografia foi o tratamento antropológico, entendendo a Inquisição como um complexo cultural, representada por rituais e símbolos que garantiam a manutenção do Tribunal. Partindo dessa abordagem é que inserimos nossa compreensão sobre os Sermões analisados. O que devemos perguntar é: quais eram as funções dessas palavras para a cristandade lusa do início dos seiscentos? Para responder essa pergunta, destacamos os adjetivos cegos, surdos e mancos, como tratamentos direcionados aos judaizantes, principais perseguidos pela Inquisição e citados nos Sermões. Como resposta, obtivemos que a pregação era um momento fundamental nos autos-de-fé, pois tinha por função social garantir uma coesão à sociedade portuguesa, indicando quem eram seus inimigos e como identifica-los; também por demonstrar a importância e a necessidade de se repetir os esforços inquisitoriais. E ainda tinha uma função simbólica, quando as palavras derrotavam os inimigos da fé, numa luta entre o bem e o mal. Tudo isso significa, portanto, que os Sermões tinham por função destacar uma imagem de seus inimigos, torná-los visíveis aos olhos de quem ouvia aquelas palavras. Não importava o erro, uma palavra valia mais que mil imagens.